A inadimplência do Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) Supera Integral - Desenvolvimento Urbano sofreu forte aumento nos últimos três meses. Mesmo com o montante de Direitos Creditórios (DC) mantendo-se estável, o volume de créditos vencidos e não pagos aumentou 104,7% no período, saltando de R$ 822,7 mil ao final de junho para R$ 1,7 milhão em setembro. Igual movimentação ocorreu com a Provisão para Devedores Duvidosos (PDD), cujo valor vem sendo incrementado em R$ 1,0 milhão por mês desde maio.
O FIDC iniciou suas operações em dezembro de 2012 e é um condomínio fechado lastreado em créditos imobiliários oriundos de Contratos de Compra e Venda (CCV) de lotes residenciais desenvolvidos pela Urbplan Desenvolvimento, cujo capital social é detido integralmente pelo grupo de private equity Carlyle. A empresa, que é a cedente dos DC em poder do fundo, era anteriormente denominada Scopel Desenvolvimento Urbano, mas teve sua denominação social alterada após a saída da família Scopel da estrutura societária da empresa, em julho de 2013.
De acordo com o Informe Mensal do fundo, em setembro, o Patrimônio Líquido (PL) do FIDC era de R$ 37,1 milhões, e nos três meses anteriores este indicador foi, em média, de R$ 39,5 milhões. Ainda em setembro, o PL da cota sênior era de R$ 34,5 milhões. À época da emissão das cotas sênior, em janeiro de 2013, estas contavam com um nível de subordinação correspondente a 20,1%.
Em 31 de outubro, a Fitch rebaixou de ‘BBBsf(bra)’ para ‘BBsf(bra)’ a classificação de risco da primeira série de cotas sênior do fundo, o que implica agora um grau especulativo para a nota da cota, com elevado risco de não atingir o benchmark estabelecido. A rentabilidade-alvo da cota é equivalente ao IPCA acrescido de juros de 8,75% ao ano. Ao mesmo tempo, a agência manteve a cota em Observação Negativa. Por si só, o rebaixamento daquela que era sua classificação inicial - ‘A(bra)(prel)’ atribuído preliminarmente em julho de 2012 - em dois níveis já caracteriza, de acordo com o regulamento do fundo, um Evento de Avaliação.
Segundo a agência, o rebaixamento reflete principalmente a deterioração da qualidade de crédito dos contratos cedidos ao fundo; o desempenho abaixo do esperado dos projetos residenciais; e a redução da subordinação disponível para os cotistas sênior.
Como fator preponderante, é apontado que a Urbplan não vem cumprindo com a obrigação de recompra de créditos cedidos em desacordo com o contrato de cessão, e de recompra de contratos que se tornaram inadimplentes por mais de 90 dias ou que foram distratados. Os cotistas haviam deliberado por exigir a recompra de determinados direitos creditórios, conforme mecanismo previsto no regulamento, em assembleia realizada em 2 de abril de 2013. O montante de créditos a serem recomprados atingiam aproximadamente R$ 5,4 milhões.
Contudo, a empresa firmou instrumento de confissão de dívida e se comprometeu a pagar o montante devido em sete parcelas mensais, das quais a primeira já foi paga em outubro, em valor de R$ 1,0 milhão. Se a cedente não cumprir as novas obrigações assumidas junto ao fundo, a Fitch informa que as cotas sênior poderão ser novamente rebaixadas.
Na mesma assembleia que aprovou a recompra dos DC, restou aprovada também, suspensão, por prazo indeterminado, de novas aquisições de créditos, até que haja deliberação em sentido contrário pelos cotistas, e a transferência da responsabilidade de emissão e cobrança de boletos da Scopel para um terceiro, a Interservicer. Um dos motivos para a convocação da assembleia foi a existência de créditos inadimplidos e de créditos distratados, além da aquisição de quatro créditos devidos por pessoas jurídicas, que totalizavam R$ 3,69 milhões, estes últimos em desacordo com as condições de cessão estabelecidas no regulamento.
Ainda em abril, dessa vez em assembleia no dia 29, os cotistas já consideravam a liquidação do fundo, decisão esta que foi postergada. Ademais, constava na Ordem do Dia um item que precisa ser cotejado com a recente Instrução da CVM, a de nº 531, publicada em janeiro de 2013. Este item apontava que dever-se-ia notificar a empresa responsável pela guarda dos documentos comprobatórios, a fim de se ratificar três pontos: que tais documentos estão sob sua guarda, que estes se encontram devidamente segregados e que a empresa não está permitindo o acesso a tais documentos por terceiros sem a prévia e expressa autorização do custodiante da operação, o Banco Santander Brasil. Ressalta-se que este foi um dos fundos pioneiros na terceirização da guarda física dos documentos comprobatórios, antes mesmo da dita instrução, necessitando de um processo de autorização exclusivo para tal fim, em agosto de 2012.
Nesta assembleia os cotistas destituíram a Supera Consultoria Financeira da posição de consultora especializada, responsável por identificar, analisar e selecionar os créditos a serem adquiridos pelo fundo.
Além disso, os cotistas decidiram pelo provisionamento para devedores duvidosos em montante equivalente a cem por cento dos direitos creditórios objeto da notificação direcionada à Scopel pela CRV, administradora do fundo e pertencente ao grupo econômico do Banco Santander Brasil. Com efeito, o valor de PDD, que saltou de R$ 734,5 mil em abril para R$ 9,4 milhões em setembro, já consumiu a maior parte do valor das cotas subordinadas, e caso continue nessa trajetória as cotas mezanino também podem ser afetadas, como informa a Fitch.
Quanto às assembleias realizadas até o momento, vale ressaltar que nenhum documento de ata das mesmas se tornou disponível no site da CVM através da seu mecanismo de consulta pública de documentos. Nem há disponibilidade de qualquer versão atualizada de regulamento do fundo incorporando alterações decididas no âmbito das assembleias.
Ao final de outubro, as cotas sênior contavam com subordinação disponível de 9,2%, significativamente abaixo do mínimo de 20% determinado no regulamento. Isso acontece apesar de, em assembleia realizada na última quinzena de maio, ter sido aprovada a proposta pela cedente de reforçar a subordinação do fundo por meio da integralização de cotas subordinadas mediante a cessão de novos direitos creditórios, de acordo com o estabelecido no regulamento do fundo. Segundo o regulamento original, este tipo de desenquadramento, quando não reparado em cinco dias úteis, caracteriza um evento de avaliação.
A Fitch aponta que a inadimplência da carteira pode ser parcialmente explicada pelo desempenho abaixo do esperado dos projetos desenvolvidos, que evoluíram apenas 1,7% nos últimos seis meses. Paralelamente, a agência pontifica que o nível de unidades vendidas reportado em setembro de 2013 foi de 40,3%, inferior aos 41,4% de março de 2013, o que demonstra que o número de cancelamentos foi superior ao de novas vendas.
Por fim, a agência observa que houve elevação no custo remanescente de obras, devido a revisões orçamentárias e postergações nos prazos de entrega. O fundo tem contratado apólice de seguro com garantia de entrega da infraestrutura do empreendimento, visando mitigar parcialmente o risco de conclusão de obras. As seguradoras responsáveis pela cobertura de seguros atualmente são a Allianz Seguros ou J. Malucelli.
O Press Release da Fitch afirma que em 15 de outubro o fundo distribuiu R$ 3,8 milhões aos cotistas sênior, e que o gestor do fundo, Integral Investimentos, buscará manter um caixa mínimo para cobrir despesas operacionais e para eventuais custos legais que venham a incorrer.
Para concluir, cabe ressaltar a presença de um risco estrutural adicional para os cotistas das classes que têm senioridade em relação à classe subordinada do FIDC Supera Integral no cenário atual. Como abordado em artigo publicado no TLON em 18/04/2013, FIDC com modelo de valorização de cotas anacrônico ainda é maioria, a maior parte dos FIDC operacionais atualmente ainda estabelece em seus regulamentos uma metodologia de valorização de cotas que, se interpretada ao pé da letra, pune as classes de cotistas que têm senioridade em relação à classe mais subordinada em situação específica. Isto pode ocorrer em função de situação de estresse em um fundo onde haja recuperação de perdas após qualquer período no qual o benchmark de uma classe não foi atingido. Por conta deste tipo de metodologia, o investidor desta classe de cota não recebe o valor equivalente ao benchmark para todo o período de investimento. O artigo supracitado explica de forma detalhada este fenômeno.