Em 2020, o mercado de títulos verdes global atingiu a marca cumulativa de US$ 1 trilhão. No Brasil, esse mercado também tem crescido exponencialmente desde a emissão do primeiro título verde do país, em 2015. Desde então, outros rótulos ligados à sustentabilidade vêm surgindo no mercado, demonstrando um grande apetite por instrumentos sustentáveis.
Dados da Climate Bonds Initiative até junho de 2021, apontam que o mercado de dívidas sustentáveis – que inclui os rótulos verde, social e sustentável – chegou a US$11,7 bilhões. Títulos verdes representam 87% desse volume, sendo o mais consolidado entre os rótulos temáticos. No Brasil, a categoria de uso da terra – agricultura e florestas – representa 25% da destinação do recurso verde, depois de energia renovável com 50% – eólica, solar e bioenergia. Esse percentual se torna ainda mais significativo se considerarmos a representatividade desta categoria no mercado global, por volta de 4%. A participação do setor no rótulo sustentável também é considerável, com 33% da destinação do recurso sustentável.
Onde tudo começou...
Um dos primeiros títulos rotulados no Brasil foi o CRA Verde emitido pela EcoSec com lastro em Nota de Crédito à Exportação (NCE) devida pela Suzano. A operação de R$ 1,00 bilhão (US$295 milhões) veio a mercado em novembro de 2016, com recursos destinados ao financiamento do manejo florestal sustentável. The Forest Company do Brasil Participações estava na ponta devedora do segundo CRA Verde, emitido pela True Securitizadora em montante de R$ 39,4 milhões (US$10 milhões), também para ativos florestais em setembro de 2019. Até 2019, as principais operações brasileiras no setor de agricultura eram destinadas para o setor de papel e celulose. Outros grandes players desse setor, como a Klabin e Celulose Irani, também emitiram títulos verdes, mas utilizando outros instrumentos de dívida (como notas globais e debêntures).
Em 2020, o número de CRAs Verdes aumentou consideravelmente, junto a uma maior diversificação dos setores financiados. A Rizoma Agro saiu na frente e emitiu as CPR-Financeiras que lastrearam o primeiro CRA Certificado com base nos Critérios de Agricultura do Climate Bonds Standard no mundo em agosto de 2020. A histórica operação demonstrou o potencial da certificação para emissões no setor de agricultura. A operação de R$ 25,0 milhões (US$ 5milhões) teve como destinação de recursos o financiamento de (i) agricultura orgânica regenerativa; (ii) silos para secagem e armazenamento de grãos; (iii) a produção de insumos biológicos; (iv) equipamentos mais modernos e eficientes para práticas agrícolas digitais e de baixo carbono; (v) e sistemas de plantio direto.
Outra empresa do setor de agricultura a se financiar através de um CRA Verde foi a SLC Agrícola. O CRA de R$ 400,0 milhões (US$94 milhões) emitido em dezembro de 2020 teve seus recursos destinados ao financiamento de práticas de agricultura digital e de baixo carbono, e sistemas integrados. Também em 2020, o setor de bioenergia entrou para o mercado de títulos verdes com a emissão do CRA Verde devido pela FS Bioenergia em julho. A operação de R$ 210,0 milhões (US$39 milhões) teve como objetivo a produção de etanol de milho e cogeração.
Até março de 2021, outros três CRAs Verdes relacionados a empresas do setor de biocombustíveis foram emitidos. A Usina Rio Amambai (R$60,0 milhões/ US$11 milhões), a Colombo Agroindústria (R$358,0milhões/ US$65 milhões) e a Ferrari Agroindústria (R$80,0 milhões/ US$15 milhões) estiveram na ponta devedora de CRAs rotulados. As operações foram voltadas para a produção de biocombustíveis e cogeração. No setor de agricultura, a Produzindo Certo (R$63,0 milhões/ US$12milhões) e Solinftec (R$140,0 milhões/ US$26milhões) se financiaram através de outros dois CRAs Verdes certificados do mundo. As operações foram importantes marcos para o mercado de finanças sustentáveis do setor por serem a primeira operação pulverizada (Produzindo Certo) e a primeira a ir para uma empresa de tecnologia (Solinftec).
Mercado promissor em crescimento
Apesar de ainda ser uma alternativa incipiente para o setor de agricultura e atividades relacionadas, como a produção de biocombustíveis, o mercado de finanças verdes tem recebido um número cada vez maior de operações verdes rotuladas e certificadas. Trata-se de uma clara sinalização de que as empresas e os produtores estão conseguindo acessar este mercado. Esse instrumento, já conhecido pelos investidores, mostra-se cada vez mais valioso aos produtores agrícolas de norte a sul do país. Prova disso são os resultados do anuário de CRA da Uqbar, que apresentou número recorde de emissões em 2020.
A possibilidade da emissão de CRA em moeda estrangeira, possibilitado pela Lei 13.986/2020, que permite a emissão de CRAs diretamente no mercado offshore, sem a necessidade de serem depositados em bolsas locais, permite que investidores estrangeiros tenham acesso a esse importante instrumento de financiamento do agronegócio, sem a necessidade de abertura de uma conta local de investimento. Esse desdobramento pode facilitar, cada vez mais, as emissões de CRAs Verdes lastreados em recebíveis devidos por produtores, cooperativas e outras empresas do setor.
Além do rótulo verde, o CRA também tem se beneficiado do rótulo de sustentabilidade. Tomemos como exemplo a emissão de US$200 mil do CRA devido pela Tabôa, cuja destinação de recursos será voltada para o financiamento da agricultura familiar de cacau, no bioma Mata Atlântica. A Tabôa fornecerá recursos para sistemas agroflorestais e outras práticas que incentivem a conservação, restauração e recuperação de áreas degradadas ou o reflorestamento de vegetação nativa. Essa operação demonstra o potencial de outros rótulos temáticos para CRAs.
O mercado brasileiro de dívidas sustentáveis está crescendo, e CRAs têm sido uma importante ferramenta para o agronegócio acessar o mercado de capitais verde. A Climate Bonds Initiative também tem visto outros instrumentos de securitização como CRIs e FIDCs recebendo o rótulo e certificações verdes. Desta forma, a expectativa é que o agronegócio passe a acessar ainda mais essa forma de financiamento. O Brasil tem escala, ativos verdes e todos os instrumentos necessários para se tornar o maior mercado de títulos agrícolas sustentáveis do mundo.
Sobre a Climate Bonds Initiative
A Climate Bonds Initiative (CBI), parceira da Uqbar, é uma organização internacional sem fins lucrativos, com foco no investidor, que trabalha para mobilizar o mercado de capitais em busca de soluções para mudanças climáticas. A CBI promove o investimento em projetos e ativos necessários para uma rápida transição para uma economia de baixo carbono e resiliente ao clima. A estratégia é desenvolver um grande e líquido Mercado de Títulos Verdes e Climáticos que ajudará a reduzir o custo de capital para projetos de baixo carbono em mercados desenvolvidos e emergentes.