Desde que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) editou a Instrução CVM nº 531 (ICVM 531), alterando e aperfeiçoando a Instrução CVM nº 356 (a norma que rege o mercado de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC)), movimentações relevantes ocorreram no universo de custodiantes e administradores destes fundos. Em função das iniciativas necessárias para adequação à nova norma, uma transformação na composição de mercado destes prestadores de serviço protagonistas dos FIDC se materializou. A Uqbar publicou em outubro¹ extenso artigo sobre o impacto da ICVM 531 no mercado de custodiantes e, agora, no presente artigo, aborda as mudanças ocorridas no mercado de administradores de FIDC.
A nova instrução teve como parte importante de sua motivação estruturas consideradas precárias, por diversos motivos, de operações de FIDC que tinham a participação dos Bancos Panamericano, Cruzeiro do Sul, BVA e Rural. Assim, a consequente liquidação ou redução destas operações específicas, em função inclusive da liquidação de seus cedentes, se provou um fator relevante na transformação da composição do mercado de administradores de FIDC, impactando a participação daqueles que atuavam junto àquelas operações. Outro fator transformador da composição de mercado de administradores que é resultante, de forma indireta, da ICVM 531 diz respeito ao alargamento do escopo de obrigações e responsabilidades dos custodiantes de FIDC trazido por esta norma, que elevou o custo operacional deste último prestador de serviço. Mudanças resultantes, referentes ao mandato de custódia, ou mesmo a liquidações de fundos, impactaram a participação dos administradores dos respectivos fundos, os quais muitas vezes pertencem ao mesmo grupo econômico dos custodiantes afetados. Por fim, alterações estruturais relacionadas à função da cobrança de direitos creditórios e à relação econômica de participantes com os cedentes dos fundos, ambas constantes na ICVM 531, também afetaram administradores de FIDC, mudando a composição deste mercado.
Nos vinte meses subsequentes à divulgação da ICVM 531 houve administradores que aumentaram fortemente suas participações de mercado, principalmente quando o critério utilizado é o número de fundos sob administração. Na primeira comparação que se segue, na Figura 1, toma-se por base dois momentos no tempo, em dezembro de 2012, anterior à edição da norma, e setembro de 2014, oito meses após o encerramento do prazo para adequação à mesma. É exibida, para cada período, a composição do mercado de administradores pelo critério de número de FIDC sob administração. Vale ressaltar que o número total de FIDC aumentou de 368 para 415 entre as duas datas1.
Figura 1 - Composição do número de FIDC por administrador
Observa-se que dois participantes, a Sociedade Corretora Paulista (SOCOPA) e a Petra (inclui Banco Petra e Petra Personal Trader), destacaram-se como aqueles que elevaram de maneira mais expressiva o número de fundos sob sua respectiva administração, aumentando suas participações de mercado por este critério. O aumento na fatia de mercado destes dois participantes acompanhou o crescimento do número de FIDC de Factoring, segmento em que esses dois administradores têm forte participação e se posicionam de forma diferenciada. Ao todo, durante o período aqui abordado 42 novos FIDC de Factoring entraram em operação, dezenove administrados pela Petra e dezoito administrados pela SOCOPA. Atualmente existem 169 FIDC de Factoring em operação, sendo que, dentre estes, 70 são administrados pela SOCOPA e 56 pela Petra.
A SOCOPA alcançou a marca de um total de 93 fundos sob sua administração ao fim do mês de setembro de 2014, obtendo um aumento de 66,1% quando comparado aos 56 fundos que administrava em fins de dezembro de 2012. Dentre os componentes deste crescimento, cabe destaque para o ganho de quinze mandatos, nove deles referentes a FIDC de Factoring, e a estreia de 26 novos fundos sob sua administração. Em compensação, o banco perdeu um mandato e outros três de seus fundos foram liquidados.
Em seguida, nota-se que o Petra, ao final de setembro, atingiu a marca de 80 fundos em operação sob sua administração, registrando aumento de 60,0% em relação aos 50 que o banco detinha ao final de 2012. Tal aumento se deu após a assunção, pelo Petra, da administração de nove fundos já em operação, mas que em dezembro de 2012 estavam sob responsabilidade de outros participantes, sendo que o ganho de três destes mandatos diz respeito a FIDC de Factoring. Ainda, 33 novos fundos entraram em operação administrados pelo Petra. Por outro lado, houve perda de nove mandatos para outros participantes e liquidação de três fundos no período.
Ainda que em base ligeiramente menor, também merece destaque o aumento de participação obtido pela Gradual CTVM. Este participante elevou o número de FIDC administrados de 29, em dezembro de 2012, para 35, em setembro último, um crescimento da ordem de 20,7%.
A Tabela 1, abaixo, ilustra as participações de mercado dos administradores de FIDC em dezembro de 2012 e em setembro de 2014, e a evolução entre estes dois momentos, destacando-se apenas aqueles que apresentaram aumento da quantidade de fundos administrados.
Tabela 1 – Administradores que aumentaram a quantidade de FIDC
Por outro lado, outros participantes do mercado de FIDC diminuíram seus respectivos números de fundos sob administração entre os dois momentos apontados, por perda de mandato ou liquidação de fundos. Os dois administradores que mais reduziram o número de fundos administrados sofreram o decréscimo por conta, principalmente, de encerramento de fundos. O primeiro caso é o da BEM DTVM, participante que chegou à marca de 37 fundos em setembro deste ano, que é uma redução de 14,0% quando comparado aos 43 referentes ao final de 2012. Esta mudança se deu após a perda de um mandato de administração e o encerramento de dezessete fundos anteriormente administrados pelo banco. A Intrag DTVM, por sua vez, com a marca de cinco FIDC administrados em setembro de 2014, teve reduzido em 54,5% o número de fundos em relação aos onze sob sua administração em dezembro de 2012. Neste caso, a diminuição ocorreu mesmo sem que houvesse perda de mandatos. Isto porque foi sete o número de FIDC encerrados no período, o segundo maior número deste indicador entre todos os participantes que diminuíram a quantidade de FIDC sob administração.
Destaque ainda para o participante que mais perdeu mandatos de administração de FIDC decorrentes de substituição: o Citibank. No período, o Citibank registrou perda de dez mandatos, que, somando-se ao encerramento de três fundos, explica os dezenove FIDC contabilizados sob sua administração em setembro de 2014, equivalente a uma queda de 20,8% ante os 24 fundos em fins de 2012.
A Tabela 2, abaixo, ilustra as participações de mercado dos administradores de FIDC em dezembro de 2012 e em setembro de 2014, e a evolução entre estes dois momentos, destacando-se apenas aqueles que apresentaram diminuição da quantidade de fundos sob administração.
Tabela 2 – Administradores que diminuíram a quantidade de FIDC
Em uma segunda comparação, ilustrada pela Figura 2, também entre dezembro de 2012 e setembro de 2014, são exibidas as composições do mercado de administradores em cada um dos dois momentos, agora pelo critério de Patrimônio Líquido (PL) sob administração. É preciso levar em consideração que o PL consolidado de todos os FIDC se reduziu de R$ 53,30 bilhões para R$ 51,40 bilhões entre as duas datas².
Figura 2 - Composição do PL por administrador
Além da redução do número de FIDC sob sua administração, a BEM DTVM, administrador que detém a maior participação atual pelo critério de montante de PL sob administração, também sofreu forte diminuição deste segundo indicador, o equivalente a uma variação negativa de 17,6%. As cifras de montante sob administração deste participante saíram de R$ 14,40 bilhões ao fim de 2012 para os R$ 11,80 bilhões registrados em setembro último. Outro participante que apresentou queda relevante de PL sob sua administração, a maior em termos percentuais entre os administradores, foi a Votorantim Asset, tendo este montante se reduzido de R$ 5,90 bilhões ao fim de 2012 para os atuais R$ 3,40 bilhões ao fim de setembro de 2014, ou uma variação negativa de 43,2%. Este movimento ocorreu concomitantemente à redução de quatro FIDC sob sua administração, apontada acima.
Mesmo não tendo aumentado de forma considerável o número de fundos sob sua administração, a Oliveira Trust apresentou o maior percentual de aumento pelo critério de montante de PL. O participante saiu de R$ 4,70 bilhões administrados ao fim de 2012 para R$ 6,55 bilhões ao final de setembro deste ano, um aumento da ordem de 38,2%.
Com relação aos dois participantes que mais ganharam mandatos de FIDC no período, também foram alcançados expressivos aumentos de montante de PL administrado. O Petra somou R$ 3,67 bilhões ao fim de setembro último, variação positiva de 41,1% em relação aos R$ 2,60 bilhões de fins de 2012. Já a SOCOPA alcançou a marca de R$ 3,31 bilhões ao final mês de setembro deste ano, um aumento de 106,9% quando comparado com a cifra consolidada sob administração há vinte meses, de R$ 1,59 bilhão.
¹ - Ver artigo: A transformação do mercado de custodiantes de FIDC depois da ICVM 531
² – Os dados não incluem o FIDC Sistema Petrobras NP que é administrado pelo ITAU e em setembro de 2014 apresentava PL de R$ 19,76 bilhões